Emprego de tecnologias na produção de ovinos e caprinos. Foco em nutrição



Emprego de tecnologias na produção de ovinos e caprinos.

Foco em nutrição

 Carina Barros

 

O termo tecnologia tem origem na época da Revolução Industrial no final do século XVIII e era utilizado para os setores da indústria têxtil e mecânica. Hoje é entendido como "um conjunto de conhecimentos, especialmente princípios científicos, que se aplicam a um determinado ramo de atividade", segundo o Dicionário da Língua Portuguesa, de Aurélio Buarque de Holanda.

 Precisamos ter em mente que tecnologia está estritamente relacionada à competitividade. Conforme as inovações tecnológicas surgem, há necessidade de incorporá-las aos processos produtivos e gerenciais de modo a melhorar o resultado da atividade.

É importante lembrarmos que uma nova tecnologia pode ser oriunda da combinação de tecnologias já utilizadas e que nem sempre novos processos/produtos requerem novas tecnologias.

Nesse contexto, iremos abordar o emprego da tecnologia nos sistemas produtivo de ovinos e caprinos focando em primeiro lugar na nutrição, seguindo para a reprodução e depois finalizaremos com a gestão. Vamos começar então com a nutrição! Apresentamos a seguir uma revisão sobre o tema.

Avanços na área de nutrição

A produtividade dos rebanhos tem aumentado com os avanços nutricionais adotados. Há diversas pesquisas científicas em busca de melhor aproveitamento da dieta, especialmente porque essa representa grande parte dos custos de produção. Partindo do fato dos ovinos caprinos serem ruminantes, sua dieta básica é o volumoso, representado por forrageiras que formam as pastagens. 

Nos últimos 50 anos ocorreram avanços significativos nos estudos de forrageiras no Brasil, tendo importância os trabalhos de Aguiar (2000a; 2001b) que relatam fatos históricos marcantes. Até o final da década de 70 foram introduzidos capins do gêneroCynodon sp, Brachiaria sp. e cultivares de Panicum maximum. Na década de 80 houve lançamento de cultivares avaliados nas condições brasileiras por instituições publicas de pesquisa e, na década de 90, também por empresas privadas. Segundo Aguiar (2004) o lançamentos de cultivares testados em condições brasileiras pode ser considerado avanço tecnológico por aumentarem as opções de plantas forrageiras para diferentes tipos de ambientes e condições de exploração. Ressalta-se o amplo estudo de plantas nativas da Caatinga com potencial forrageiro, tais como juazeiro, xiquexique, mandacaru, macambira e palma forrageira, entre outras, devidamente relatadas no trabalho de Nogueira et al. (2010). 

Atualmente, as forrageiras são intensamente avaliadas em relação à diferentes formas de manejo, seja para corte ou para pastejo e periodicamente tem-se novas recomendações que geram maior produtividade e sustentabilidade do sistema. Segundo Euclides (2001), para competitividade, o sistema deverá possibilitar maior da capacidade de suporte das pastagens, que pode ser obtido com adubação, uso de irrigação nas condições em que for uma prática recomendável, uso de suplementação alimentar em pasto e mesmo o confinamento dos animais. Todas essas tecnologias atualmente são amplamente estudadas para os caprinos. 

No campo de fertilidade do solo, as recomendações convencionalmente baseadas em boletins de recomendações de calagem e adubação vêm passando por avanços, publicações nos últimos anos propõem o uso de modelos matemáticos de predição, como o Balanço de Massa e o Modelo Dinâmico com vantagens de fazer balanços nutricionais para produtividades específicas, considerar a complexidade da dinâmica dos nutrientes na pastagem (reciclagem de nutrientes), permitir melhor entendimento e evolução das recomendações de adubação e seus efeitos sobre a produtividade e sustentabilidade da pastagem (AGUIAR, 2004). 

A estacionalidade da produção das plantas forrageiras tropicais é uma das dificuldades, pois é característica marcante no Brasil (ROLIM, 1994), relacionada a fatores climáticos (intensidade de chuvas, fotoperíodo, temperatura). Há algumas técnicas para equacionar o problema. Nesse contexto, a irrigação é uma das estratégias reguladoras da produção, que começou a ser empregada na década de 90 (CARDOSO, 2002) e pode reduzir o efeito da estacionalidade, entretanto, seu emprego deve ser coerente com o nível tecnológico da exploração pecuária, a otimização do uso da terra e o retorno econômico (VITOR et al., 2009). Observa-se crescente interesse pelo uso da irrigação de plantas forrageiras, com trabalhos enfocando a produção e a qualidade da forragem em regimes de corte e pastejo (RIBEIRO et al., 2008; LOPES et al., 2005; MISTURA et al., 2006).

Pode-se citar ainda a consorciação de gramíneas e leguminosas que é uma tecnologia interessante a ser adotada, pois o estabelecimento na mesma área pode melhorar a fertilidade do solo, aumentar a produção de forragem e melhorar a dieta animal devido a maior oferta de matéria seca, diversificação e maior teor protéico. Isso porque as leguminosas fixam o nitrogênio no solo e na planta, fazem acúmulo de biomassa vegetal e ciclagem de nutrientes (PAULINO et al, 2008a). Uma retrospectiva do seu uso pode ser obtida em PAULINO et al. (2008b) Essa prática já foi considerada desgastada pelos insucessos obtidos no passado, mas atualmente torna-se mais importante e factível devido às novas práticas de cultura e de manejo, associadas a novas cultivares geradas pela pesquisa (BARCELLOS et al., 2003).

Com objetivo de contornar a estacionalidade da produção forrageira, estratégias como pastejo diferido, suplementação dos animais em pastagem ou confinamento também podem ser empregadas. Para suplementação dos animais pode-se conservar alimentos por ensilagem (grãos ou gramíneas) ou fenação. Como inovações tem-se ensilagem de culturas do girassol e milheto (LIMA et al., 1999), pastagens e cana (NUSSIO, SCHMIDT & PEDROSO, 2003), e pré-secagem de forrageiras (AGUIAR, 2004) para ensilagem ou fenação. Nesse contexto, a indústria de maquinas tem contribuído com o lançamento de maquinas e implementos, tais como maquinas forrageiras para ensilagem de pastagem (AGUIAR, 2001a), produção de pré-secados e corte de cana-de-açúcar (BALSALOBRE, 1999). Aditivos químicos e inoculantes bacterianos para ensilagem foram lançados e melhoram os processos fermentativos resultando em melhor digestibilidade e consumo pelos animais, com superior ganho de peso. 

Os alimentos suplementares concentrados são amplamente estudados, especialmente a utilização de subprodutos de agroindússtrias na dieta dos animais. Destacam-se os resíduos de fruticultura, tais como uva (DANTAS et al, 2004), abacaxi (CORREIA et al., 2006), semente de urucum, bagaço de caju desidratado e farelo da castanha de caju (MORAES et al., 2007), maracujá e melão (LOUSADA JÚNIOR et al. 2005; 2006), goiaba (NEIVA et al., 2002); resíduos de indústrias de cana-de-açúcar, mandioca, carnaúba (NOGUEIRA et al., 2010), casca do grão de soja (HASHIMOTO et al., 2007). Alguns desses produtos têm potencial de substituição de ingredientes como milho e soja, utilizados na alimentação humana e que são de alto custo. Além disso, estão disponíveis em grande quantidade nas regiões de indústria, são de fácil aquisição e têm baixo custo. Pode-se citar também a inclusão na dieta de fontes de nitrogênio não-protéico, como uréia, para suprir deficiências protéicas da dieta (TOSTO et al., 2007). É possível encontrar no mercado rações comerciais específicas para ovinos e caprinos de acordo com suas exigências nutricionais, com diferentes formas físicas: farelada, extrusada, peletizada ou triturada, o que interfere no desempenho animal. Os suplementos minerais formulados especificamente para caprinos também estão disponíveis desde a década de 70, sendo possível encontrar minerais quelatados à moléculas orgânicas que facilitam a absorção pelo organismo animal. Pode-se citar também os avanços na linha de aditivos para dieta, com efeitos nutricionais como aumento do consumo, controle da degradação ruminal e de compostos secundários de plantas sobre a microbiota ruminal e produção de nutracêuticos; além do efeito ambiental pela redução da emissão de metano (ARCURI & MANTOVANI, 2005). Os principais aditivos são fungos (Gordon et al., 1993), leveduras Saccharomyces cerevisiae e Aspergillus oryzae (WALLACE, 1994), enzimas exógenas (celulases, xilanases) (MEDEIROS & LANA, 1999) e ionóforos (RANGEL et al., 2008).

Dois sistemas ganham mais importância na produção animal, a integração lavoura pecuária (ILP) e o sistema agrossilvipastoril. Importante revisão de CARVALHO et al. (2005) relata que a ILP sempre foi bastante utilizada, o que é novo no Brasil é a aplicação em sistemas de plantio direto, com forte crescimento na adoção dessa tecnologia, particularmente no centro-sul do país. No Cerrado o enfoque é a rotação de culturas, recuperação dos solos e de pastagens degradadas e no Sul do Brasil, rotação e diversificação, mas principalmente como alternativa de renda e utilização da terra nos períodos inter-lavouras de verão. Segundo os pesquisadores, as benesses da ILP são associadas à redução de custos, aumento da eficiência do uso da terra, melhora dos atributos do solo, redução de pragas e doenças, aumento de liquidez e de renda. Portanto, tem grande potencial de exploração para produção de caprinos.

Os sistemas agrossilvipastoris representam uma modalidade de uso da terra em que há interação da produção de árvores, forrageiras e herbívoros no mesmo ambiente em equilíbrio (ANDRADE et al., 2003). O sistema permite a obtenção de produtos múltiplos com mais sustentabilidade, sendo notável o interesse dos produtores. Entretanto, o maior entrave à desse sistema é a falta de informações técnicas para auxiliar, tanto no planejamento quanto no gerenciamento (ANDRADE et al., 2003). Magalhães et al. (2004) citam que os sistemas agrossilvipastoris que considerem as peculiaridades dos recursos naturais da região devem ser concebidos e testados de modo a tornar a atividade agropecuária mais produtiva, mais sustentável e menos danosa ecologicamente. Publicação de Martins et al. (2009) revela dados recentes dos resultados do sistema implantado na Caatinga e aponta que além dos impactos econômicos e financeiros favoráveis, o sistema promove melhor convivência do complexo unidade produtiva-família com as instabilidades climáticas, atua pela proteção das nascentes (mata ciliar) e redução das perdas de água pelo solo, promove impactos positivos no solo protegendo da erosão e favorecendo sua biologia, mantém a integração da vegetação nativa ao processo de produção e favorece a fauna nativa pela preservação dos habitats. 

Observa-se o emprego mais frequente de técnicas de mensuração da produção de pastagem para o planejamento alimentar. Tais técnicas são descritas na década de 80 por (HODGSON, 1990) e na pesquisa brasileira surgem com GARDNER (1986), entretanto somente no final da década de 90 surgiram os primeiros trabalhos (BARIONI et al., 1998; AMARAL 2001). Com o avanço e difusão dessas técnicas, tem-se a base para o planejamento alimentar em pastejo denominado por Barioni et al.(2003) de "Planejamento e gestão do uso de recursos forrageiros". Pelo fato desse tema ser recente, pode ser considerado inovação, e em breve centros de pesquisas, instituições de ensino e empresas privadas, colocarão no mercado softwares para a gestão da produção de alimentos em sistemas de pastejo (AGUIAR, 2004).

A respeito do balanceamento de dietas, há necessidade de conhecer as exigências nutricionais dos animais. Para ovinos e caprinos tem-se publicações recentes como o sistema britânico AFRC (1998), americano NRC (2006), francês INRA (1988) e australiano CSIRO (2007). Diversos avanços ocorreram acerca das exigências nutricionais, entretanto ainda há escassez de informações sobre caprinos quando comparados a ovinos, e para um futuro próximo vislumbra-se progressos na construção de modelos específicos que considerem aspectos biológicos que influenciam as necessidades nutricionais para cada função fisiológica (RESENDE et al., 2008). Ressalta-se o desenvolvimento de softwares específicos para balancear dietas com base nesses sistemas que muito auxiliam o trabalho do nutricionista.

Após essa revisão, vamos agora apresentar em forma de quadro resumo os principais avanços na área da nutrição.

Quadro 01 - Representação das inovações tecnológicas na área da nutrição.


Diante dessas constatações, qual impacto do uso dessas tecnologias no processo produtivo?

O emprego de forrageiras mais adaptadas à região e mesmo as nativas permite maior produtividade e persistência de forragem na área. No caso de forragens perenes a tendência é reduzir a necessidade de compra de mudas ou sementes, pois uma vez formada a pastagem não há necessidade de replantio, desde que mantida a mesma área. Entretanto, se a forrageira for de ciclo anual, as aquisições tendem a aumentar, já que anualmente será feito o plantio na área. O mesmo ocorre para novas recomendações de corte e pastejo e consorciação das forrageiras. Com relação às recomendações de adubação específicas para cada área, o uso de fertilizantes pode aumentar ou mesmo diminuir, dependendo do manejo atual da área. Observa-se que há tendência de aumento das aquisições de insumos na maioria dos casos apresentados. Na adoção de integração lavoura pecuária ou sistema agrossilvipastoril, o produtor necessitará de insumos antes não utilizados, o que acarretará em novas transações, até mesmo com outros agentes do sistema agroindustrial. Em todos os casos a incerteza produtiva pode ser reduzida, o que facilita o planejamento e gerenciamento da atividade.

Na área de forrageiras, nota-se que com a adoção das tecnologias ocorre maior produção de forragem, o que significa mais alimento disponível para os animais, e muitas vezes de maior qualidade. Com isso, a incerteza pode ser reduzida, já que umas das dificuldades é a disponibilidade de alimento. Dessa forma, as transações entre produtor e frigoríficos tende a ser mais frequente. Com a melhoria da dieta é possível abater os animais mais precocemente e produzir melhores carcaças. A manipulação da dieta permite que o produtor produza carcaças conforme a demanda do mercado. 

Há tendência do produtor contar mais com a presença do técnico para prestar serviços e apoiá-lo. Isso porque novas tecnologias implicam em novos métodos de manejo e alteram as atividades da fazenda. O produtor precisa de auxílio técnico para planejar e prever resultados, bem como para realizar treinamento aos funcionários envolvidos na atividade. Para isso, há necessidade de acompanhamento técnico especializado na área a fim de obter os resultados desejados com o investimento.

 

Diante desses cenários apresentados, deixamos uma questão para discussão. Quais são as tecnologias que você utiliza no seu processo produtivo e quais os impactos foram percebidos com sua adoção? Contamos com sua participação e no próximo artigo trataremos na reprodução!

 

Fonte: www.farmpoint.com.br




Home Menu WhatsApp
Topo